O imbróglio judicial que envolve a arte de Tarsila do Amaral

Série de quinze trabalhos em nanquim sobre papel se encontra no centro de disputa que faz ferver a discussão sobre a autenticidade de obras de arte.

Por Sofia Cerqueira

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A saga pelo reconhecimento das ilustrações começou em 2011, quando Correia herdou o espólio literário de Frederico Ozanam de Barros, biógrafo do poeta modernista Guilherme de Almeida. Ao vasculhar a vasta papelada, ele bateu os olhos na coleção de desenhos, sem sinal de assinatura. Mas havia, no verso de uma das imagens, uma pista que poderia levar ao autor — a frase “Viagem pela costa do Brasil, do Rio Grande do Sul ao Ceará, em 1925”. Ao longo de um minucioso mergulho, descobriu-se que os desenhos povoados de barquinhos, coqueiros, ondas do mar e o Pão de Açúcar ilustrariam um livro do poeta, amigo de Tarsila, que acabou nunca saindo.

Submetida à comissão do catálogo Raisonné (publicação que certifica e elenca as obras de um artista) da celebrada modernista, a série de desenhos não foi considerada falsa, mas também não obteve o tão almejado selo de autenticidade. Sem um parecer unânime, ingressou na lista de peças sobre as quais pairam incertezas, da qual Correia tenta retirá-la. Na ação, além da editora do livro, são réus duas das maiores autoridades em Tarsila, integrantes do comitê avaliador — Aracy Amaral e Regina Teixeira de Barros.

Documentos anexados ao processo sugerem que Aracy não teria apreço por obras de “fundo de gaveta”, o que seria o caso dos desenhos e, por isso, votou contra. Já Regina, segundo a acusação, chegou a atestar informalmente sua veracidade e até intermediou uma possível venda da coleção, o que ela nega. “Essa ação, além de questionar um corpo técnico e isento, individualiza a decisão de uma comissão”, argumenta Fernando Lamenza, advogado das pesquisadoras. Do outro lado do ringue, Mario Solimene Filho, que defende Correia, sustenta a solidez das provas, entre as quais análises independentes de laboratórios da USP. “Nossa intenção é, com fatos, obter uma decisão judicial que substitua o parecer dessa comissão”, explica ele, que ainda pleiteia uma indenização de 100 000 reais por danos morais.